quarta-feira, dezembro 27, 2006

O coração posto a prova

Com essa força duradoura,
hora ferro, hora pedra em
brasa. O meu passo atrasa
o meu peito detém o ar.

Eu começo a transmutar
e me torno uma concha,
de casca espessa e dura.

Onde encontro a cura,
onde enterro os ossos
dessa minha armadura?

Marina Ráz

quinta-feira, agosto 31, 2006

Abelhas e anzóis

Tenho apenas em mãos
esse sentimento obtuso
e como um inseto intruso
ele perfura a minha pele
se instaura como um grão,
ou um ídolo numa caverna.

Faço oferendas e canções
para essa flor interna,
amo-a tanto que meu coração
fica magro, se torna pequeno
diminuto e sorridente,

pois nasce em minha boca
no lugar de todos os dentes
flores, sim! Todas doces, ternas
e sufocantes.

Marina Ráz

domingo, agosto 27, 2006

Algo precioso

Meus músculos dançam
uma doce valsa serena
lançam meus braços ao redor
de uma pequena arena
de cor e odores sensíveis
que são invisíveis e delicados,

como relicários que guardam
segredos não contados
ou recados sem destinatários.

Deixe-me contar esse soluço
que me sobrecarrega tanto
enquanto eu expulso
todos os medos com espanto,

essas relíquias esquecidas
que se apoderam de tudo.

Marina Ráz

sexta-feira, agosto 25, 2006

Praças, fumaça e andaimes

Sinto-me como um tijolo
}soluçando{ entre dúzias
de outros suportando tolo
todo peso cambaleando,

ligados nesse concreto
fraco, desse corpo reto
lógico e cômico.

Sou lugar de descanso
uma passagem do tráfego
de botas, chinelos e sapatos
num baile sujo e trágico.

Um pedaço de pedra,
a paisagem concreta
atrapalhando o retrato.

Marina Ráz

sexta-feira, agosto 18, 2006

Acene novamente

Imensidão, todas as passagens
são paredes brancas, vejo tantas
mensagens riscada nos muros;
códigos, pedidos de socorro, mas
são todas sussurros em coro.

Onde me levam meus passos
para calabouços, cadafalsos?
Sento-me no chão e espero
meu corpo se enraizar no asfalto,
pois é tudo que quero. Que
o mundo me tome de assalto.

Marina Ráz

segunda-feira, abril 24, 2006

A fruteira

Todos os homens
são como feras
hora devoram-se
outra se lambem
saborosos brutos
nesse gládio vão-se eras
e alguns tufos,

todos merecem as rosas
troféus e vitória
régias ou ruínas
na suína batalha
de toda sina, de todo estória.

Marina Ráz

quarta-feira, abril 05, 2006

Roçar de asas

Desculpe se te devoro
lhe cuspo os ossos, olhos,
pois só sei amar assim
antropófaga e desmedida
sou algoz e prisioneira
de todas as franquezas;

amar, amar, amar, amar
eu recito e desmistifico
todas as fraquezas do mito.

Marina Ráz

sexta-feira, março 31, 2006

Leiam os jornais

Engulo ar como vidro.
Como vidros partidos
estilhaços asteróides
perco meus sentidos
(gata sem bigodes).

Marina Ráz
estilíngua

Curo as doenças do corpo
com o paladar, com a saliva.
Ocupo o andar com crenças
e busco tudo que se esquiva,
como um terremoto absorto
alimento e sacio o mundo
com dez perolas plantadas
da bocarra de um porco.

Marina Ráz

quarta-feira, fevereiro 22, 2006

Pétalas

Toda paisagem se cansa
o sol diz que vai sambar
e tudo vira uma sombra,
ficam as almas nesse tromba-tromba,
onde esse mundo vai acabar?

Marina Ráz

domingo, fevereiro 19, 2006

Doidivanas

Estou disposta a qualquer morte
morrer na lança de Quixote,
bang-bang, cut and shot!
Um alvo esperando a seta,
uma maça na cabeça do poeta.

Marina Ráz
Sim floriu

A paixão é uma pedra
que se lança.
O amor é um pendulo
que se cansa.
Tudo mais é uma dança,
quanto mais o tempo
corre, menos se alcança.

Marina Ráz
O sangue não carrega espinhos

As rugas se acomodam
na face, face ao sorriso
que nasce no olhar liso,
seco e vivo.

Marina Ráz